Na semana passada, estava no plantão de psiquiatria, aguardando ansiosamente a chegada do próximo plantonista, quando de repente, escuto:

 

“Doutor, você pode renovar minha receita do Frontal, por favor”?

 

É raro, mas acontece muito.

O que você faria caro leitor? Renovaria ou não? Hoje, iremos desvendar os mitos e verdades a respeito do Alprazolam, mais conhecido nas farmácias com o nome Frontal®.

Frontal® é o nome comercial que a empresa farmacêutica Upjohn Company (hoje incorporada à Pfizer) escolheu para o princípio ativo alprazolam na década de 1970. Aprovado em 1981, pelo Food and Drug Administration (FDA), inicialmente com o nome Xanax, mas ganhando destaque e vendas no Brasil com o nome Frontal. É indicado para o tratamento de transtorno de ansiedade e transtorno do pânico. Pertence a classe dos “benzodiazepínicos”, os famosos tarja preta, assim como o Rivotril ( se você ainda não leu o texto sobre o Rivotril, a leitura é obrigatória - https://talkpsiquiatria.com.br/rivotril-solucao-ou-problema/).

Seu mecanismo de ação ainda é pouco conhecido, mas aparentemente reduz a tensão, a agitação, causando uma sensação de relaxamento e sonolência.  É disponível nas apresentações comprimidos: 0,25mg, 0,5mg, 1mg e 2mg.

Agora, vamos as dúvidas mais comuns:

  • É um remédio tarja preta? Sim! Seu uso deverá ser feito sob cautela com acompanhamento e prescrição médica.
  • Pode causar dependência? Sim e acontece muito! É comum o indivíduo precisar de doses cada vez maiores para atingir o mesmo efeito (tolerância - 1 critério da dependência de benzodiazepínicos).
  • Pode ser usado por grávidas e lactantes? Deve ser evitado! Frontal® é um medicamento classificado na categoria D de risco de gravidez.
  • É indicado para crianças? Não! É contra indicado para menores de 18 anos.
  • Quanto tempo demora para fazer efeito? Os picos de concentração plasmática ocorrem em 1 a 2 h após a administração.
  • Quando devo usar? Conforme prescrição médica para transtornos ansiosos e do pânico.
  • Pode levar a esquecimentos? Sim! É um efeito colateral muito comum.
  • Qual a dose máxima? De acordo com a bula 10mg/dia (conforme prescrição médica!).
  • Devo usar por no máximo quanto tempo? Os dados disponíveis corroboram a utilização da medicação por até 6 meses para transtornos de ansiedade e por até 8 meses no tratamento dos transtornos de pânico.

Não, não tomei Frontal® mas acabei esquecendo da grande questão inicial do título deste texto!  Vamos lá:

  • Causa demência? Vamos analisar a revisão: “Benzodiazepinas e risco de demência: qual a evidência?

De acordo com a publicação de 2018 de Sara Gonçalo Domingues e Vânia Raquel Paula Gomes o objetivo do estudo foi determinar se a utilização crónica de benzodiazepinas (frontal, rivotril, valium, lorax) em indivíduos com idade ≥65 anos está associada a um aumento do risco de demência.

 Foram analisadas pesquisas de guidelines, revisões sistemáticas, meta-análises e estudos observacionais, nas línguas inglesa e portuguesa, publicados entre janeiro de 2006 e março de 2016, com os termos MeSH ‘benzodiazepines’ e ‘dementia’. Foi aplicada a escala Strength of Recommendation Taxonomy (SORT), da American Family Physician, para avaliação dos níveis de evidência (NE) e da força de recomendação (FR).

Qual o resultado? Obtiveram-se 209 artigos e, destes, cinco cumpriram os critérios de inclusão. A meta-análise e a revisão sistemática revelaram uma associação entre a utilização de benzodiazepinas e o aumento do risco de demência (Nível de evidência (NE) 3). Este risco aumenta com a duração do tratamento, com doses cumulativas de benzodiazepinas e com a utilização de benzodiazepinas de longa duração de ação, tal como diazepam (NE 3). Porém, os estudos observacionais não evidenciaram esta associação (NE 3). O estudo concluiu que existe evidência limitada para a associação entre o uso de benzodiazepinas e o risco de demência.

Assim, são necessários mais estudos de coorte prospectivos, com um longo tempo de seguimento. Para quem ainda quiser se aprofundar no tema, vale a pena ler este estudo: “Shash D, Kurth T, Bertrand M, Dufouil C, Barberger-Gateau P, Berr C, et al. Benzodiazepine, psychotropic medication, and dementia: a population-based cohort study.Alzheimers Dement. 2016;12(5):604-13”.

Por fim, conheça as curiosidades do Frontal®:

  • Se usado com álcool ou outros depressores do sistema nervoso central pode levar a sedação grave levando até coma ou morte.
  • A descontinuação abrupta pode levar a síndrome de abstinência. É sugerido que a dose diária de Frontal® seja reduzida em não mais que 0,5 mg a cada 3 dias.
  • Em caso de intoxicação ligue para 0800 722 6001, se você precisar de mais orientações ou diretamente para o 192.
  • Ele é prescrito no receituário azul (B1) e em caso de falsificação pode levar até a reclusão.
  • Deve ser conservado em temperatura ambiente (entre 15 e 30°C), protegido da luz e umidade

Lembre-se, o   Frontal® é uma medicação segura desde que utilizada conforme prescrição médica. Restou alguma dúvida? Entre em contato conosco!

 

Referências bibliográficas:

1) Billioti de Gage S, Pariente A, Bégaud B. Is there really a link between benzodiazepine use and the risk of dementia? Expert Opin Drug Saf. 2015;14(5):733-47.

2)  Shash D, Kurth T, Bertrand M, Dufouil C, Barberger-Gateau P, Berr C, et al. Benzodiazepine, psychotropic medication, and dementia: a population-based cohort study.Alzheimers Dement. 2016;12(5):604-13

 

Autor do texto:

Dr. Milton Spolon